O Festim da Montanha

O Festim da Montanha

Para qualquer viajante
Que se aproximasse
Veria a luz
Que a montanha produz

Havia música
Passos, gritos e balbúrdia!
Por aqueles, lá no alto a festejar
Segundo eles, para fugir da angústia

Era uma festa bonita
Todos vestidos, muito bem
Chegavam cada vez mais
Aos milhares, milhões e além

As luzes eram coloridas
Havia para todos os gostos
Bebidas, música, belos rostos
Distribuíam sorrisos, tentadores
Felicidade pura, cura para todas as dores

Festa grande, admirável
Tantos milhões! Amável
Mas se o viajante perguntasse
Não era festão, era festim
Pequena, pouca gente
Havia algo errado,
Fazendo assim?

Havia!

Para qualquer viajante
Que se aproximasse
Veria que a luz
Que a montanha produz
Iluminava, a própria face
Composta
de cadáveres

Os participantes do festim
Dançavam, no topo da carne
Bebiam vinho carmim
E da montanha arrancavam
O sangue carmesim
Que a face da montanha
Pintava de rubim
Criando o quadro da morte
A verdadeira obra do Fim!

Mas não havia final
O festim dos mortos
Dos dançantes, no topo
Se retroalimentava dos corpos

Havia lá uma doença
Transmitida nos copos
Nas falas, nos gritos
No ranger dos dentes
Do aglomerar dessa gente

E dançavam
A noite inteira
Até que adoecessem
E virassem, para os ainda dançantes
Esteira

E do nascer o dia
Para os dançantes, expectativa não havia
O corpo do monte só aumentava
Quando mais adentrasse a pandemia
E o viajante
À montanha dos ossos
Da morte, dos corpos
Assistia
Enquanto das lágrimas
Enxugava o rosto
E só restava
Em seu posto
Continuar sua viajem
A difícil jornada na espera da cura
Que não lhe faltasse coragem

Apesar de tudo
Mesmo que não soubesse
Sozinho jamais estivera
Outros viajantes, ao leste
Ao norte, ao sul e oeste
Passavam pelo mesmo
Estavam juntos, nesta sina
Aguardando, inexoráveis
A prenunciada vacina